O Que Fazer Nordeste de Amaralina

O Que Aconteceu na Gamboa Poderia Ter Acontecido no Nordeste de Amaralina

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Na manhã da última quinta-feira (18), uma operação coordenada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur) em conjunto com a Guarda Civil Municipal e a Polícia Militar da Bahia gerou uma reação forte da comunidade da Gamboa. O objetivo da ação era fiscalizar e coibir construções irregulares, mas o que se seguiu foi uma demonstração de violência e arbitrariedade contra moradores de uma área historicamente marginalizada. A operação resultou na demolição de uma casa pertencente a um pescador, uma família de negros e trabalhadores da comunidade, onde a resistência já se fazia presente há anos.

A situação é semelhante a muitas que ocorreram ao longo da história da região Nordeste de Amaralina, uma comunidade com um contexto social e urbano diferenciado, onde a especulação imobiliária, as políticas públicas falhas e a violência urbana têm sido protagonistas de um drama social que ameaça apagar a memória e a identidade local. Embora a Gamboa tenha atraído a atenção das autoridades devido à sua localização privilegiada e os interesses imobiliários, o que aconteceu ali poderia facilmente ser um reflexo da luta diária dos moradores do Nordeste de Amaralina.

Assim como em outros momentos de nossa história, o povo de Nordeste de Amaralina tem sido constantemente desafiado a resistir à pressão das forças externas que buscam transformar a comunidade para atender aos interesses de uma elite que não se importa com a preservação da cultura e da memória de um povo. A diferença é que, em nosso território, a luta tem sido mais visível. A comunidade tem se organizado, se unindo para enfrentar as ameaças à sua permanência no local e à preservação de seu modo de vida, mas a luta é árdua e contínua.

É difícil não ver um padrão entre o que ocorreu na Gamboa e o que acontece todos os dias no Nordeste de Amaralina: o processo de especulação imobiliária é uma realidade, com áreas como a Orla de Salvador sendo alvo de grandes empreendimentos que não dialogam com a realidade da periferia. O local, que historicamente sempre foi de acesso restrito para os moradores de classe média e alta, hoje está se tornando um centro de interesse, onde as classes populares, como pescadores e pequenos comerciantes, são deslocadas por projetos que visam um público diferente, aquele que tem dinheiro para gastar e que busca transformar os espaços tradicionais em locais de consumo.

A violência da operação na Gamboa, com o uso de balas de borracha, gás de pimenta e a presença de forças policiais para garantir a demolição de uma casa construída por uma família de pescadores, remonta ao cenário do Nordeste de Amaralina. Ali, a presença da polícia e a repressão se fazem constantes, principalmente quando há manifestações contra a gentrificação, contra os altos índices de violência urbana ou contra as condições precárias de vida na região.

Moradores que, há décadas, resistem ao processo de marginalização e ao despejo, hoje enfrentam um cenário ainda mais complicado: a insegurança pública, alimentada pela violência do tráfico e pela escassez de políticas públicas efetivas, somada à crescente pressão da mídia e da criminalização dos territórios periféricos, faz com que muitos considerem a mudança para outras áreas, mais seguras ou com melhores condições de vida. A juventude, muitas vezes sem esperança e sem perspectivas, perde o sentimento de pertencimento à sua terra, algo que, ao longo dos anos, foi fundamental para a construção de uma identidade comunitária forte e orgulhosa.

O efeito que esse processo tem é claro: a desvalorização do local, impulsionada pela falta de investimentos em infraestrutura e serviços básicos, somada à violência e à ausência de oportunidades, cria um ambiente propício para a especulação imobiliária. À medida que os moradores se mudam, as áreas se tornam mais “atrativas” para o mercado, que compra os imóveis a preços baixos e depois os revende por valores muito mais altos, trazendo uma mudança no perfil da região. Esse é o modelo que o sistema deseja reproduzir em várias partes de Salvador: destruir o tecido social das comunidades periféricas para criar espaços exclusivos para um público com maior poder aquisitivo.

No entanto, assim como a comunidade da Gamboa resistiu à violência dessa operação, os moradores do Nordeste de Amaralina continuam a lutar pela manutenção de sua identidade, por seus direitos e por um futuro onde suas histórias, suas tradições e suas vidas possam ser respeitadas. O que aconteceu na Gamboa é um reflexo de um processo mais amplo que poderia facilmente ser vivido aqui, mas a resistência das comunidades, através das organizações locais, associações e movimentos sociais, permanece sendo a única força capaz de enfrentar a violência da exclusão e da gentrificação.

Hoje, a luta no Nordeste de Amaralina é a mesma de sempre: resistir à marginalização, à violência e ao apagamento da sua história e identidade. A operação na Gamboa deve servir de alerta para todos nós, pois é um exemplo claro de como as periferias estão sendo tratadas pela lógica do mercado e do Estado, sempre à margem dos interesses das grandes corporações. No entanto, a resistência do povo continua firme, e é isso que nos dá esperança de que, com união, organização e luta, podemos evitar que o futuro do Nordeste de Amaralina se repita em outras áreas da cidade.